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A FIFA que me perdoe, mas Acarajé é fundamental. Que história é essa de, na Copa do Mundo, as baianas ambulantes terem de se afastar para não concorrerem com os hambúrgueres de uma rede de fast food patrocinadora da Copa do Mundo de 2014? Ufa! Fiquei até sem fôlego! Que repressão é essa? Primeiro escondem o acarajé, depois a feijoada, mais tarde a cervejinha no final da tarde, depois o jabá com jerimum, todos os refrigerantes de marcas concorrentes, até o momento em que nos mandarão calar a boca se só soubermos falar o português…

Caros leitores, me tirem só uma dúvida? A Copa de 2014 não será no Brasil? O acarajé não é baiano e a Bahia não fica no Brasil?

Perdoem-me, mas por um momento imaginei que eu estava na terra de Tio Sam e fiquei um pouco confusa. A lavagem cerebral é grande e, enquanto os brasileiros concentram-se em serem receptivos aos “visitantes”, “os visitantes” vão entrando, chegando como quem não quer nada, tomando conta da televisão, da geladeira, até nos colocarem para dormir no quintal – na melhor das hipóteses. E o brasileiro vai deixando, sorrindo e achando tudo normal. Toca um pandeiro aqui, apresenta um ponto turístico ali, mostra uma morena tomando sol acolá e oferece de bandeja ao turista aquilo que nos pertence como se fosse tudo muito natural e apropriado, não muito diferente do que aconteceu com os primeiros habitantes de Pindorama, só que de uma forma mais sofisticada.
  
O país está sendo engolido de todas as formas e as pessoas parecem viver constantemente no mundo da teledramaturgia! Onde está a nossa identidade nacional? Nós somos os “anfitriões” da Copa, não temos que nos adaptar aos outros países, a outras culturas. Devemos recebê-los bem sim, com respeito, com boas instalações, com segurança, mas o país é nosso! É de todos nós brasileiros.É inadmissível aceitar que a FIFA determine o “afastamento” das baianas ambulantes que vendem acarajé!

Isso, infelizmente, me faz lembrar um trecho de “No caminho com Maiakóvski”, que diz assim:

“Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na Segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.[...]“

Falemos agora ou entalaremos em 2014 com a boca cheia de hambúrguer e aí, meus amigos, já não haverá tempo para dizer mais nada no meio de tantas caxirolas.

Texto de minha autoria publicado no dia 29 de outubro de 2012 na revista  feedback magazine. mais detalhes acesse o site.